quarta-feira, março 08, 2006

PETER PAN E A SOMBRA DO TERRORISMO

MUNICH
Idem. EUA,2005. De: Steven Spilberg. Com: Eric Bana, Daniel Craig, Ciarán Hinds, Mathieu Kassovitz, Hans Zischler, Mathieu Almaric, Ayelet Zorer, Michael Lonsdale, Geoffrey Rush, Marie-Josée Croze, Gila Almagor, Moritz Bleibtreu, Valerie Bruni Tedeschi, Lynn Cohen, Yvan Attal, Robert John Burke, Yahuda Levi. A/DR. Visto 03/03 . 164 min
Comentário:
Spilberg é Spilberg e ninguém pode lhe tirar o mérito de ser um dos mais influentes diretores das últimas décadas. Subverteu o gênero do suspense, tornando carros e animais marinhos aterrorizantes (Encurralado e Tubarão); deu um nono e poderoso impulso aos filmes de aventura (Indiana Jones); ensinou que os extraterrestres também podem ser camaradas (E.T. e Contatos Imediatos do Terceiro Grau); e mostrou sem retoques os horrores vividos pelo seu povo durante a segunda guerra (A Lista de Schindler). Taxado de eterna criança e Peter Pan da indústria cinematográfica, face aos recorrentes temas infantis e a constante mania de instituir em suas obras improváveis finais felizes, num mundo onde a falta de caráter e o ódio racial imperam. Seus personagens sempre têm um surto de bom mocismo e eventualmente atingem a redenção. Exemplo crasso é o personagem Arthur Schindler, que tem um deslavado surto emocional na última cena do filme que deu o Oscar ao diretor e comprovou que ele também poderia desenvolver temáticas adultas, apesar da derrapada final com o objetivo de verter lágrimas nas platéias mundiais e glorificar um personagem que, apesar do apoio aos judeus, era antes de tudo um comerciante e não a “mamãe Dolores” apregoada pelo diretor. Mas críticas a parte, após sucessivas derrapadas (O Terminal, Guerra dos Mundos), ele retorna ao mundo dos adultos e aborda o espinhoso conflito entre árabes e judeus. Adaptando o romance Vengeance: The True Story of an Israeli Counter-Terrorist Team, de George Jonas, ele retrata com virtuosismo técnico e violência explícita o sangrento seqüestro perpetrado por terroristas do grupo Setembro Negro contra atletas israelenses, durante as Olimpíadas de Munich em 1972, e as suas inevitáveis conseqüências políticas. Acuada por não ter negociado com os terroristas, a Primeira Ministra de Israel, Golda Meir, deixa a diplomacia de lado e vê como única alternativa pagar na mesma moeda a chacina que eliminou nove atletas e manchou de sangue a bandeira de Israel. Para cumprir a tarefa, convoca a temida Mossad, polícia secreta israelense, para planejar e executar o plano de vingança. O jovem Avner, ex-guarda-costas da Ministra, é designado como líder da equipe formada por mais quatro membros, todos com passado desconhecido e unidos em torno de um único objetivo: localizar e matar, um a um, os 11 terroristas árabes envolvidos no atentado de Munich. Vivendo como clandestinos e contando com as informações do francês Louis, uma fonte duvidosa, que na verdade trabalha para os dois lados e coloca em risco a vida dos agentes. Trabalhando com um elenco internacional, predominantemente formado por australianos e ingleses e sem nenhum americano (fato raro na obra de Spilberg), o diretor traça passo a passo o planejamento e a execução dos assassinatos, intercalando cenas do seqüestro em Munich e destacando o crescente conflito ético vivido pelo personagem de Avner. Ao mesmo tempo em que executa friamente os seus alvos humanos, acompanha o nascimento da filha e é privado do convívio familiar. Aos poucos , ele vai perdendo a sua identidade e o foca da missão, virando um mero e frio assassino sem pátria e objetivos de vida. Sem tomar partido, a mensagem de Spilberg é clara: um conflito que de início tinha como foco a disputa territorial, transformou-se num banho de sangue desmedido, onde a vida humana perdeu o seu valor e o ódio racial tomou o espaço ocupado pela ideologia política e o amor pátrio. Desde já, um dos melhores filmes do diretor, com fotografia de Janusz Kamisnski, roteiro de Tony Kuschner e Eric Roth e música de John Williams que pontua com maestria os momentos de tensão. Foi indicado para cinco Oscars e não ganhou nenhum.

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